terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Cia. de Teatro Contemporâneo, Trupe Intacta Retina, aborda Shakespeare sem pretensões nem pudores



A Cia. de Teatro Contemporâneo, Trupe Intacta Retina, aborda Shakespeare sem pretensões nem pudores, com a participação da jovem actriz portuguesa Carolina Floare, que para além de integrar o elenco, é também responsável pela tradução e adaptação. A direcção é de Sílvia Carvalho.

Uma história imortal, recontada em algum lugar do tempo.
Talvez em 2012 – o ano do “ponto zero” – para que, ao mesmo tempo que a recontamos, a contemos pela primeira vez.

Em algum Reino indefinido à beira-mar, morre subitamente a Rainha. Dois meses passados, o Rei viúvo já está casado com sua antiga cunhada, a nova Rainha, para espanto do povo e revolta da Princesa, ainda em luto pela mãe. Acontece que o espírito inquieto da Rainha falecida ronda o palácio durante as madrugadas até conseguir se comunicar com a filha. A revelação é terrível: houve um assassinato. Uma irmã matou a outra para ter acesso ao poder e ao amor do Rei. A Princesa, intimada a fazer justiça e a endireitar seu Reino caído na corrupção de valores, renuncia ao amor, reflete e, consequentemente, hesita, procura provas através da loucura e do teatro... Uma vida interrompida por um destino maior que a vida: eis o caminho sinuoso da tragédia.

É isso mesmo. E se Hamlet fosse uma mulher? E se tivéssemos uma Rainha assassina? E um Rei entre elas? E se Ofélia fosse Ofel? E se, mesmo assim, a história fosse exactamente a mesma?

“Hamlet” foi escrita por Shakespeare na virada para o século XVII e tornou-se a peça mais estudada, citada e encenada da história do Teatro Mundial. Obra literária divisora de águas, referência do Humanismo, de uma Revolução Moral. O ser humano que se liberta dos grilhões das certezas medievais da alma e ousa perguntar-se: ser ou não ser? A passagem da Idade Média para a Renascença continua a operar-se ainda hoje, em cada alma. É por isso que “Hamlet” nunca morre e é universal, por que é a maior reflexão sobre a condição humana.

Hamlet 2012” é uma nova tradução deste poema ilimitado e, como tal, busca novos limites da sua beleza e vigor originais. Ao mesmo tempo, é uma adaptação da obra para esse tempo e esse espaço definidos apenas por uma contemporaneidade e por um mar. A inversão dos géneros de (absolutamente) todos os personagens é um desafio experimental à própria essência da obra: o seu humanismo. Para a reflexão sobre a condição humana, obviamente tanto faz ser-se homem ou mulher. E é exactamente essa essência da obra que queremos fazer ressaltar, através da surpresa de estarmos perante a mesma história apesar da subversão radical das formas.
Fora isso, é mais um “Hamlet” erguido por mais uma trupe de atores apaixonados por seu ofício, que um dia quiseram criar caminhos transversos e novos sentidos para tocar e viver a maior peça do mundo. Sem pretensões. Mas também sem pudores.

Com nove actores, o grupo de formandos de Teatro da Cia. de Teatro Contemporâneo, Trupe Intacta Retina, convidou Sílvia Carvalho para dirigir e ter uma participação especial como Espírito e Ronnie Marruda para viver o Rei Geruth.

Os outros catorze personagens são distribuídos assim: Hamlet é vivida por Carolina Floare, Claudia por Vívian Rodrigues, Ofel por Rodrigo Viegas, Horácia por Luiza Valente, Polonia por Camila Falconi, Laertes e Atriz por Thais Favatto, Guilden Stern e Coveira por Luana Crispim, Rosen Crantz e Marcela por Carol Zétola e Bernarda, Reinalda/Osrica e Atriz por Thainá Targino.

Francisco Leite assina a direcção de arte, Luciana Belchior a direcção de movimento, Renato Rocha a esgrima artística, João de Carvalho a trilha, Aurélio de Simoni faz acontecer a luz e Jansen Raveira responde pelas tecnologias de projeção usadas em cena.

O actor e professor Maurício Gonçalves, padrinho de formatura da Trupe Intacta Retina, escreveu a respeito: “Hamlet 2012 me parece uma proposta imbuída desse novo espírito. É uma aposta. Cada um tem seu Shakespeare. Harold Bloom entronizou o bardo no centro do cânone ocidental; Peter Brook, em suas encenações, surripiou o respeito pelo tradição do império; Tom Stoppard tirou-lhe as calças. O grupo da Trupe Intacta Retina, formado basicamente por mulheres, pretende – e é assim que me parece – destruir a máquina de alter idade que conformou a mulher, aqui, por estas plagas. Não é um Hamlet feminino. É um flirt, uma obra aberta, em processo, um trabalho de reconfiguração. Seja dito: Carolina Floare, a tradutora dessa montagem, é a própria imagem das novas articulações. Bailarina, portuguesa, poliglota, brasileira, actriz, escritora e tudo que o verso ainda tiver fôlego para dizer. Portanto, o que se espera não é somente uma peça de teatro. Sim, um convite de outras sereias, de novas cantoras. Que o Ulisses-espectador se perca e jamais retorne à casa. Para o emigrado, toda terra é estrangeira, inclusive a sua origem.”

Estreia 13, 14, 15 e 16 de Fevereiro no Teatro Maria Clara Machado, Rio de Janeiro.

2 comentários:

f disse...

Agradeço ao FITEI pela publicação da matéria! Nós, da Trupe Intacta Retina do Rio de Janeiro, esperamos muito poder atravessar o Atlântico em 2012 e ter a honra de apresentar no Festival nossa encenação de Hamlet.
Um grande abraço ao FITEI!

Rodrigo Gallo disse...

Fantástico.

Simplesmente fantástico